08/02/2021 - 11h06min
Perspectiva completa uma década de Gazeta Centro-Sul. Lembro das conversas com o Leandro sobre ocupar um espaço nesse importante veículo de comunicação da cidade. A preocupação era definir um conceito para a coluna, ou seja, uma “cara”. Com esse intuito, ficou definido, a princípio, a missão de pautar conjuntura local, prioritariamente, políticas públicas e acontecimentos que, de alguma forma, tivessem relevância no dia-a-dia. Em síntese, diria que o foco do desafio seria (e continua sendo) elaborar textos provocativos, com nuances críticas e reflexivas. Com essa formatação, dia 5 de fevereiro de 2011, Perspectiva se apresentou, convidando os leitores à interação nos debates, sempre toda primeira semana de cada mês.
Não posso deixar de contar o lado pitoresco da definição do nome da coluna. Buscando sacramentar o que escrever e como proceder, mandei para o jornal uma prévia do primeiro texto. Aguardando sinal de fumaça, recebi um telefonema do “chefão”. Sem deixar que ele falasse, lasquei: o que aconteceu? Disse ele, com voz calma e pacificadora: Qual é o nome que vai ter a tua coluna? Não tinha pensado nisso. Após essa demanda, fiquei um longo tempo pensando. Quase virei a noite em claro e não vinha nenhuma ideia.
Dia seguinte, no trabalho, com a preocupação de resolver a pendência que travava a tarefa, numa reflexão solitária, pensando alto, resmunguei: Quais são os princípios e temas que pretendo abordar nessa missão? Essa pergunta levou a outro questionamento: Quais são minhas perspectivas? Nesse momento, virei para o colega de sala, parceiro de décadas, já acostumado a essas maluquices, e disse – Perspectiva! É isso! É óbvio!
O parceiro, bem calmo e sorrindo, comentou que se eu achava, estava de acordo. Entretanto, completou, se explicar melhor, posso contribuir. Ao esclarecer a demanda, ele fez cara de quem estava pensando, em silêncio, e, depois de um curto tempo, sentenciou: Ficou instigante e ambicioso! Nunca perguntei o que ele quis dizer com isso, mas gostei, pois representava (e continua representando) a que vinha a coluna. Revivendo isso, lembrei de um pensamento de Carlos Drummond de Andrade – “Necessitamos sempre de ambicionar alguma coisa que, alcançada, não nos torna sem ambição.”
Antes de falar com o “patrão”, o Leandro, fiz uma análise sobre a mensagem que o nome proposto passaria para nossos leitores. Vejamos!... Pensei novamente em voz alta. Perspectiva é uma palavra de múltiplos sentidos. Pode significar o modo como se analisa determinada situação ou fato ou um ponto de vista sobre uma situação ou, simplesmente, a maneira de entender e avaliar conjunturas. Também pode ser um exercício futurístico.
Já se aproximando o dia do debut da coluna, liguei para o Leandro e fui de sola dizendo - “Perspectiva”. Houve um curto e angustiante silêncio do outro lado da linha, cortado por um seco comentário. Não sei!... Vamos pensar mais. Não demorou muito, me ligou dizendo: Gostei! Ficou legal! Assim começou essa interessante e gratificante parceria que completou 10 anos – uma década.
Outro ponto importante a destacar foi o “andar da carroça e o acomodar das melancias”. Ou seja, comecei a ter clareza da caminhada a partir da interlocução crítica, o que foi fundamental na reestruturação e na qualificação necessária para alçar “Perspectiva” no padrão deste semanário e obter o interesse e prestígio dos leitores. Aqui cabe destacar que essa é uma tarefa que não termina nunca. É permanente e necessária. Diria até ser uma retroalimentação indispensável.
Outro ponto a relatar é que em toda a minha vida profissional trabalhei com a crítica. Nenhum projeto, artigo, texto, notícia, qualquer publicação, saía sem passar por debates – crítica – e, posteriormente, ser liberada por uma comissão editorial. Confesso que o sabor dos comentários feitos pelos parceiros de Perspectiva é outro. No trabalho, era obrigação. Já com meus leitores, sempre entendi e continuo entendendo como uma atenção, um carinho, por mais duro que seja o comentário. De forma simbólica, diria que é música para meus ouvidos. Eu, verdadeiramente, curto crítica! Aprendi, com o tempo, que crescemos nos embates e nos contraditórios. Outra lição da vida é que mudar de opinião, reconhecer estar errado, é uma grande sabedoria.
Fiz uma rápida passagem pelos textos publicados nesses 10 anos. Nessa expedita releitura identifiquei a gradativa transmutação no estilo de escrever e de conteúdo. As primeiras edições ainda estavam contaminadas por um modelo de escrita de quatro décadas de trabalho profissional e de pesquisa socioeconômica e ambiental. Era um andamento pesado, parágrafos longos, com muitos detalhamentos. Um cacoete difícil de contornar.
A experiência de colunista da Gazeta Centro-Sul me fez ver que é muito mais fácil escrever um texto técnico, de dezenas de páginas, do que passar uma ideia numa lauda, no espaço reservado para publicação da coluna. Hoje, como presente de aniversário, ganhamos este espaço especial.
A maior dificuldade na produção de uma crônica está em não ficar preso em detalhes que, na maioria das vezes, teimam em aparecer. A preocupação constante é manter o tema e o foco. Pautar um assunto em poucas linhas, transmitir uma ideia e provocar reflexão, sem o auxílio de informações complementares, é bastante desafiador. Mas... é “instigante” e gratificante!
Fui, os poucos, apoiado na crítica, me policiando e harmonizando o fluir das palavras. Nessa transição pode ser percebido, segundo a opinião de alguns amigos, o surgimento de um estilo, de um “conceito”. Como disse a Lúcia: “Apareceu a tua cara!” Aliás, falando nela, é preciso reconhecer que foi a que realmente contribuiu na definição do estilo de texto, da forma e da estrutura, que levaram ao encontro de uma concepção para Perspectiva. A coluna tem, também, a cara dela. Para quem ainda não sabe quem é a Lúcia, é a amada esposa, a companheira de uma vida, a mãe das minhas filhas, a vó dos meus netos, a maior crítica e, sem sombra de dúvida nenhuma, a coautora.
Só tenho a agradecer ao Leandro André por ter me colocado nessa empreitada. Ultimamente, vejo “perspectivas” de temas para debate em tudo que me rodeia. Está sendo difícil selecionar o que falar. Passou a ser mais um desafio diário. Meu reconhecimento aos parceiros da Gazeta e aos amigos e colaboradores. Por fim, lembro a razão de ser dessa coluna: os leitores. Sem eles, nada teria sentido e por isso dedico a todos minha gratidão.
“Cada um de nós é, na perspectiva cósmica, precioso. Se um ser humano discorda de você, deixe-o viver. Em cem bilhões de galáxias, você não vai encontrar outro.” (Carl Sagan - Cosmos)
Túlio Carvalho
Publicado em 5/2/21.
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