08/06/2021 - 08h29min
Seria muito sem graça, esse mundo, se convivêssemos exclusivamente com quem pensa exatamente como nós, se ouvíssemos dos outros nada além daquilo que já sabemos que nos diriam, se não aprendêssemos algo novo nas conversas com os amigos. Decretado então o fim das trocas de ideias e das controvérsias, os verbos discordar, aprender, argumentar e evoluir perder-se-iam no tédio dos dicionários.
Vivendo e aprendendo, eis o resumo perfeito da existência humana. E discordar uns dos outros deve ser parte natural dessa nossa encantadora trajetória. Porque a convivência exclusiva com aqueles que pensam exatamente como nós, em relação a tudo, tem como trágico resultado a nossa estagnação intelectual, além de ser uma tremenda chatice, sejamos francos.
Com o tempo, me convenci da necessidade das boas conversas em nossas vidas, compreendi que discordâncias nos enriquecem sobremaneira, que os bons e respeitosos debates são o tempero das amizades e da boa convivência. Afinal, se cada um de nós é único, temos muito a descobrir e melhorar uns com os outros.
Inesquecíveis e interessantes foram as lições que nós, os estudantes de outras décadas, tivemos nos intervalos, quando trocávamos a sala de aula pelo cafezinho no bar da faculdade. Mesa de quatro lugares compartilhada por oito ou dez, que se acomodavam no entorno para debater o assunto de cada dia, apresentar e confrontar teses particulares sobre política e artes, discutir filosofia e futebol, levantar questões como patriotismo e o fim das fronteiras, opinar a respeito do futuro. E sendo de apenas vinte minutos aqueles encontros, continuávamos no barzinho das noites de sexta e do sábado; nos prolongados almoços de domingo com a família.
Está ficando muito sem graça, esse mundo, onde não se pode discordar e manter amizades. Com a equivocada certeza de estarem sempre certas, muitas pessoas adotaram a pretensão de impor suas verdades como absolutas. E nesta tresloucada atitude, criaram um universo paralelo sem opiniões contrários nem críticas, feito apenas de elogios e concordâncias passageiras. Ainda não entenderam que, ao se livrarem do contraditório, decretaram o fim do aprendizado, nosso grandioso elixir.
Vivendo e aprendendo, eis o resumo perfeito da existência humana.
Cristina André
Publicado em 3/6/21.
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